ABANCATILÊ

Blogue da Rede de Bibliotecas de São Brás de Alportel


Dia Mundial da Poesia
O Clube de Leitura reuniu-se na Galeria de Arte - ZEM ARTE - e festejou a Poesia.
A Calçada de Carriche, de António Gedeão iniciou a tertúlia numa leitura encenada por Amélia Viana, Francisca Graça e Maria Hélder .
Poemas de Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Sophia de Mello Breyner Andresen, Bertolt Brecht,
Constantin Cavafis, Ary dos Santos, Vinicius de Morais, Eugénio de Andrade, e Erza Pound ecoaram ao longo da noite.
O Zé Areias, a Maria Francisca, a Maria Hélder, a Maria Belchior e o Paulo Penisga surpreenderam-nos com poemas da sua autoria.
Aqui ficam algumas imagens dessa noite, por coincidência, noite de Lua Cheia!

























O Último Cabalista de Lisboa / de Richard Zimler


Opinião de Maria Hélder:

É um extraordinário romance que tem como pano de fundo os eventos verídicos de Abril de 1506.
O que surpreende nesta obra é que embora imparável de acção não é totalmente ficção e desenrola-se em torno da busca da verdade - Quem assassinou Abraão Zarco?
Esta morte não representa apenas a perda de um familiar próximo, mas o fim de uma fonte de sabedoria inestimável - A Cabala - escola filosófica judaica, que na época constituía um importante veículo de instrução (ao longo da leitura apercebemo-nos que a população judaica de Lisboa era mais instruída que a população cristã).
É interessante verificar que muitos dos lugares falados ainda hoje existem, como por exemplo, Alfama onde se situava uma das judiarias de Lisboa e a respectiva sinagoga.
Esta obra retrata a sociedade manuelina e os horrores da perseguição aos judeus.
É, também, uma denúncia dos tempos de opressão que vive o mundo de hoje.
Nesta obra Zimler previu, com acerto, que haveria uma nova guerra no Iraque só para que a popularidade do presidente norte americano aumentasse. Antes da ascensão de Bush, já denunciava que sectores absolutamente fascistas assumiam fatias cada vez maiores do poder e denúncia sinais de xenofobia e intolerância, que são constantes na vida norte americana e crescem todos os dias. Talvez por isto decidiu recriar a sua vida na cidade do Porto (Ver a obra Meia-Noite ou o Princípio do Mundo, na qual estas referências são mais precisas).
Zimler não concorda com as posições neofascistas do governo de Israel, por isso algumas das suas obras são um libelo contra a intolerância e uma chamada à união entre os povos da Europa, Ásia, África e América para a reconstrução de um mundo melhor.
As suas obras, tal como esta, focam quase sempre construção de identidades, a amizade, a traição, o efeito nefasto das instituições impostas a uma pessoa e o significado de uma vida individual. Mas todas abordam a terrível violência entre israelitas e palestinianos e a história desta região.
Esta obra foi best seller em 11 países, incluindo nos EUA, Inglaterra, Itália, Brasil e Portugal.
Na sua nova obra À Procura de Sana, diz que, em circunstâncias semelhantes à da sua personagem, "talvez pudéssemos ser todos terroristas".
*Cabala - Estudo das letras hebraicas que permite o contacto directo e profundo com as verdades do nosso mundo e com Deus.
Ciência ou Sabedoria que produz respostas para questões que para a maioria das pessoas não tem explicação.
Richard Zimler
Nasceu em Nova Iorque, em 1956.
Licenciou-se em Religião Comparada na Universidade de Duke e fez um Mestrado em Comunicação pela Universidade de Stanford.
Trabalhou como jornalista durante 8 anos e, em 1990, mudou-se para o Porto.~
Em 1994 ganhou o Prémio Fellowship
Em 1996 escreveu o seu primeiro romance "O Último Cabalista de Lisboa", faz parte do circulo Sefardita e foi traduzido em mais de 10 idiomas.
Para além de escritor é professor de Comunicação na Universidade do Porto e tradutor de autores de língua portuguesa.
Saiba mais sobre o autor e a sua obra, comentários literários em:
Opinião de Francisca Graça:
Berequias, de nome judaico, ou Pedro Zarco, seu nome de cristão novo, a que foi obrigado por imposição régia de D. Manuel I, faz neste livro o papel de relator de todos os massacres que no ano cristão de 1506 aconteceram aos judeus em Lisboa, durante a semana da Páscoa. As piras com judeus empestaram com o seu cheiro e fumo todo o Rossio, a baixa de uma cidade porca, de bairros miseráveis e repleta de padres, em especial Dominicanos, obstinados e encarniçados a dar morte a tudo o que fosse judeu.
O que o move a regressar e a investigar as causas da morte do seu tio, mentor e o último cabalista de Lisboa só pode ser explicado e passo a citar a personagem: "para se compreender a revelação que me atingira, terei que explicar as palavras hebraicas mesiras nefesh. O seu significado é certamente a disposição para o sacrifício. O poder oculto reside na tradição dos cabalistas de estarem dispostos a arriscar-se, nem que seja a uma visita aos infernos, se com isso puderem ajudar não só a aliviar o sofrimento do mundo como também a proporcionar uma reparação na Esfera Celeste".
Através da narrativa, o autor vai-nos colocando diferentes pistas e conclusões que rapidamente se alteram perante novos dados e apenas perto do final se descobre o assassino. No decurso da narrativa, a filosofia e a prática cabalista são descritas.
Deixo-vos algumas passagens que me fizeram meditar:
-" ...pois o judeu não é nunca uma criatura simples que os cristãos sempre pretenderam fazer-nos acreditar. E um hierático judeu nunca é tão falho de espírito como pretendem os nossos rabinos. Somos antes tão profundos e abertos que nos cabe na alma todo um rio de paradoxos e enigmas."
- "Deus aparece a cada um de nós sob a forma com que nós melhor O podemos apreender. Para ti, nesse momento, era uma garça. Para outro, pode surgir-lhe como uma flor ou mesmo uma brisa."
- " O tempo é como um selo a atestar a existência. E, tal como o selo, é artificial. Como o meu tio costumava dizer, o passado, o presente e o futuro são realmente versos do mesmo poema. O nosso fim é traçar a disposição da sua rima de regresso a Deus."
- "Não posso arriscar a vida dos judeus fiando-me na equidade dos Reis da Europa que já mostraram vezes sem conta que desconhecem o que seja justiça. Pois, ainda que esteja enganado, ainda que esteja a ler da esquerda para a direita, ainda que meu tio estivesse tão cansado da vigília... podereis estar certos de que os Reis cristãos não virão um dia buscar-vos, e a todos os nossos? E que traidores como Diego não os ajudarão?"

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